Hoje foi tarde

 Mais uma estação, mais uma paragem que ficou para trás. O comboio arranca sem que te veja entrar. Abro a janela para que a brisa entre de modo a que leve todos os pensamentos que me atormentam e também o desejo de te sentir. A tua mão na minha, a hesitação do toque, aquele arrepio, o suspiro inevitável quando os olhos se encontram e o lábio inferior treme em ti e eu tenho de humedecer o meu. Deixa de interessar o que nos rodeia, como se tudo rodopiasse à nossa volta num som surdo e repetitivo. Sinto-me quente e desabotoo um botão da blusa, troco a perna esquerda por cima da direita enquanto olho a paisagem que apressada segue em sentido contrário. Só me apercebo que descobri a perna com o movimento porque o rapaz em frente não desviava os olhos. Passei com a mão na meia de lycra acariciando a perna. Ele respirou fundo. Eu sorri no sentido da janela e compus a saia. Viajamos juntos todas as manhãs, arranjamos sempre maneira de irmos juntos... guardei lugar para ti, um espaço ao meu lado, coloquei a mala e tudo para que ninguém se sentasse... Porque não vieste hoje ? Logo hoje que ia arranjar maneira de falar contigo, de ouvir a tua voz, de saber o teu nome, de te dizer o meu...Ia dizer-te que gosto do cheiro da tua roupa, do teu perfume, da educação que demonstras, da tua elegância no vestir, que gostaria de passar com os dedos no teu cabelo... é que amanhã se vieres, será tarde, eu não virei mais... já hoje foi tarde.



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