Um dia, estava eu numa igreja a assistir a uma comemoração solene quando o indivíduo que estava do meu lado esquerdo segredou-me por cima do ombro: "Isto para mim não é nada, a minha catedral é a Natureza, é lá que me sinto bem!". Tudo converge, cada vez mais.
Gosto muito de pessoas, de as ouvir, de tentar entendê-las estudando-as, dos sentimentos, dos risos, do toque... Mas à medida que o tempo decorre trazendo maturidade, à medida que envelheço, as pessoas ficam cada vez mais complicadas num crescendo assustador que abala a minha saude mental e põe em causa a minha paz interior. Numa altura em que procuro despreocupação, o cerco aperta trazendo novas equações nunca antes abordadas. E pergunto-me se não terei direito a simplesmente recusar resolvê-las. Já dei provas da minha valentia, da minha capacidade para enfrentar ventos e tempestades, não quero mais o desgaste das batalhas. O tempo que me resta tem de ser gasto em amor apenas. Abraçar, sorrir, amar...
E fujo. Corro para a Catedral que o Jorge me indicou, essa Catedral que é universal, sem deuses de altares e horas marcadas para reuniões, onde não se fala de política nem de nada com palavras.
Uma Catedral onde se escuta.
Onde no silêncio dos lábios se ouve a consciência. Onde tudo faz sentido. Onde o tempo importa ainda que efémero. Onde se chegar "a tempo" posso encontrar-me com o sol, senti-lo na pele e vê-lo partir. Na vida, chamam-se oportunidades únicas. Sim, o sol volta a estar lá no dia seguinte, mas o tempo pode estar enublado ou pode o tempo ter esgotado para mim, como uma sombra fria quando o sol se vai...
O Jorge de vez em quando foge para as montanhas nos Alpes ou volta à Amazónia de onde nem queria sair. Eu vou mais perto. E da última vez um pisco de peito azul quase pousou em mim. Aquele bater de asas, o canto, a música do movimento da água que corria na vala, o vento nas folhas das árvores sobre a minha cabeça... é ali que gosto orar, que abandono a minha condição racional e me entrego à espiritual. É ali que me encontro, que sou Eu.
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